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#Ollanta Humala

Entrevista: Ollanta Humala, ex-presidente do Peru

Os editores do GIRO conversaram com o ex-presidente Humala sobre as eleições peruanas, a crise política no país e o impacto da pandemia.

Giro Latino
#Ollanta Humala18 de ago. de 2231 min de leitura
Giro Latino 18 de ago. de 2231 min de leitura

“Bolsonaro é um oportunista”. Esse é um dos trechos da fala do ex-presidente peruano Ollanta Humala, em sua entrevista exclusiva ao GIRO LATINO, que foi ao ar no canal do Intercept Brasil em abril de 2021.

No comando do Peru entre 2011 e 2016, Humala está novamente na corrida para governar a nação andina no pleito do próximo domingo, 11/4 – mas vem mal nas pesquisas, reflexo de anos de manchetes que o colocaram no centro da sucessão de escândalos que tornou comum a derrubada e a prisão de mandatários peruanos em anos recentes. Chamado de “Lula dos Andes” quando se elegeu no início da década passada, Humala foi acusado de “traição” pela esquerda peruana – que ele agora define como “infantil”.

O ex-presidente falou de temas como Lava Jato, a recuperação dos direitos políticos do próprio Lula e o papel da imprensa peruana em investigações controversas. Humala, ele próprio investigado pela Lava Jato peruana e que chegou a passar nove meses preso, diz ser vítima de perseguição – e comentou sobre a desilusão dos peruanos com a política às vésperas de mais um pleito presidencial.

Confira a entrevista completa:

GIRO LATINO: Parte da imprensa internacional chamava o senhor de “Lula peruano”. Mas hoje seu nome é um dos últimos nas pesquisas para as eleições de abril. Primeiro, o que o senhor acha dessa comparação que sempre fizeram com o Lula? E por que tem sido tão difícil manter o apoio do povo peruano?

OLLANTA HUMALA: Bom, eu reconheço o presidente como um lutador latino-americano. Um lutador que conseguiu, entre tantos méritos, dar rumo ao Brasil: um país que, na década de 60, era conhecido por seus carnavais e por ser uma república até certo ponto “bananeira” virou a oitava potência do mundo. Além disso, Lula vem de um partido muito antigo e essa é uma das grandes diferenças em relação a nós. O Partido dos Trabalhadores tem mais de 50 anos de existência [na realidade, o PT fez 40 anos em 2020] e o Partido Nacionalista Peruano nasceu em 2006. Então eu reconheço no Lula essa força do político que vem de baixo e que demonstra à classe política brasileira que é possível desenvolver um país com esse enorme potencial. Eu tenho uma afinidade ideológica com o Partido dos Trabalhadores e com toda a política social que o Brasil tem desenvolvido. Muitos dos programas sociais que fizemos no Peru são fruto das lições brasileiras. Acho que, quando eu me candidatei à presidência, em 2011, o modelo bem-sucedido era o Brasil.

A diferença agora é que, no caso do Lula, ele tem mais de 60 anos na vida política. Eu tenho 15 anos na vida política. O Partido Nacionalista Peruano é um partido pequeno, não tem toda a infraestrutura e nem os quadros políticos de alcance internacional como o Partido dos Trabalhadores. Então há esse tipo de diferença. Além disso, enquanto no Brasil já estão sendo elucidados e derrubados os processos que têm batido com força no presidente Lula e no PT, ao ponto de permitir a chegada do presidente Bolsonaro à presidência da república levando a direita “mais dura” do Brasil ao governo, no Peru ainda não saímos dos processos. Seguimos nos processos judiciais, considerando que muito depende do que acontecer com o caso da Lava Jato no Brasil, com o caso da Lava Jato no Peru. Essa é uma das diferenças pelas quais, hoje em dia, as pesquisas não nos favorecem. Mas é preciso levar em conta que, nessas pesquisas, pouco mais de 40% da população peruana, do eleitorado peruano, ainda não decidiu seu voto.

Presidente, aproveitando que o senhor comentou sobre os muitos peruanos que não decidiram o voto: como fazer para que a população compareça às eleições e participe em meio a tanta desilusão com a política do país neste momento?

Bom, justamente estamos vivendo um processo de privatização da política. Isso ocorre de tal forma que os grandes grupos de poder econômico, que controlam também os meios de comunicação no Peru, procuram permanentemente que o eleitorado esteja insatisfeito com o governo e a classe política, para que esteja sempre disposto a procurar algo novo. A classe política assume uma postura diante do eleitorado peruano como se fossem adolescentes e, por meio de imitações de “algo novo”, tenta manter o poder para preservar seus interesses econômicos. Nessas condições, é muito difícil, ainda mais com a pandemia, sem vacinação, com covid-19, em meio a uma série de escândalos políticos no Peru, que o eleitorado possa refletir. E essa é uma luta que estamos travando no Peru, tentando chegar às pessoas, para fazê-las entender. 

No nosso caso, temos um fardo muito pesado. Somos o único partido que está concorrendo com as contas bloqueadas. Estamos competindo praticamente de mãos atadas e com um fardo que são os processos que derivam dos casos da Lava Jato. Mas sou o único candidato que tem experiência de governo. Nosso governo criou 30 programas sociais, um Ministério de Desenvolvimento e Inclusão Social, e no geral as pessoas têm saudades do nosso governo diante do que estão vivendo hoje. O que a gente precisa fazer hoje é denunciar a privatização da política. Ontem [21 de março] houve um debate, e os grupos de poder, os grupos de concentração dos meios de comunicação no Peru já praticamente escolheram seus candidatos, para que o povo peruano decida entre essas opções. Ou seja, estão surpreendendo o eleitorado peruano. De todos os candidatos, eles escolheram uma fatia e querem enfiá-los goela abaixo no povo peruano para que escolha apenas dentro desse grupo. No fim das contas, esse grupo representa os interesses desses grupos econômicos.

Presidente, enquanto falamos de política, também falamos de pandemia. No Brasil, se fala inclusive em julgar os responsáveis pela má gestão, como os ministros da Saúde e o próprio presidente Jair Bolsonaro. Esse poderia ser um caminho para o Peru?

Com certeza. Nós vimos o problema da pandemia, da primeira onda, com aproximadamente duas a três semanas de antecedência. E a segunda onda a gente viu com três meses de antecedência. Hoje em dia, há uma terceira onda na Europa e na Ásia. Então, foram tomadas medidas adequadas em relação aos estoques de oxigênio, em relação à consolidação e o fortalecimento da atenção básica na saúde pública, e foi permitido que alguns hospitais fossem reservados para a covid-19. Veja bem, ao contrário de seu país, o Peru adotou medidas drásticas como quarentena. Já no Brasil, México e Estados Unidos houve uma política de relaxamento diante da covid-19. E, ainda assim, proporcionalmente, os mortos que há no Peru são muito parecidos ou superiores aos do Brasil, México e Estados Unidos. Falo em termos proporcionais, respeitando as diferenças demográficas. 

Além disso, nós deixamos ao governo peruano, quando saímos em 2016, um saldo de 14,2 bilhões de dólares, dos quais praticamente não sobra nada. Também deixamos créditos de 2,5 bilhões de dólares por parte do Banco Mundial, que também já foram usados. E hoje em dia estamos vivendo um processo de recessão induzida. Estamos ajustando o orçamento geral da república neste ano em mais ou menos 8 bilhões de dólares. Quer dizer, há um custo econômico que não condiz com o custo de vidas humanas. Nós propomos uma comissão da verdade. No Peru, já houve comissão da verdade em razão do terrorismo dos anos 1980, que deixou um saldo de cerca de 60 mil mortos. Mas hoje a pandemia de covid-19 está levando mais de 100 mil mortos, as economias nacionais, e quase 40% a 45% da população peruana perdeu o emprego. Então acho que há motivos suficientes para instaurar uma comissão da verdade, não apenas para penalizar os responsáveis, mas para aprender as lições que hoje estamos vivendo. Considero que há três tipos de pessoas ou países: os que podem aprender pela experiência dos outros – esses são os mais talentosos –, os que precisam experimentar para aprender são o meio-termo, e as pessoas ou países mais atrasados são aqueles que precisam passar pela experiência várias vezes para que consigam aprender. E, lamentavelmente, no Peru estamos passando por duas ondas de pandemia para tomar medidas em relação ao oxigênio, às quarentenas etc.

Aqui no Brasil, entendemos o fenômeno Bolsonaro como um produto da crise política recente, da desilusão das pessoas com os políticos, com os partidos tradicionais. Ele se apresentou como um outsider que lutaria contra a corrupção, embora fizesse o contrário. Existe algum Bolsonaro hoje no Peru que possa se aproveitar dessa mesma crise política? E se existe, quem seria esse Bolsonaro?

Bom, no Peru, temos o problema de não fixar conceitos. Aqui a gente chama qualquer um de outsider. Um outsider é alguém que vem de fora e entra em um momento determinado, aproveitando uma fissura do sistema, e muda tudo. Por exemplo: eu fui um outsider em 2006. Eu era militar e, como resultado de um levante militar, houve uma ruptura no sistema político e isso abriu uma fissura para que entrassem novos atores políticos. No caso do Bolsonaro, não sou um especialista na política brasileira. Entendo que ele já é político há vários anos, acho que foi parlamentar… então não é um outsider. É simplesmente um oportunista. Ou simplesmente viu uma oportunidade, já que a justiça brasileira acabou fazendo política com o juiz Sergio Moro e anulou a candidatura do PT. Eu lembro que, naquele momento, as pesquisas colocavam o ex-presidente Lula como a principal opção de governo. E se não fosse pela questão da Lava Jato, hoje o Brasil seria governado pelo PT. Então, nesse sentido, no Peru, há várias imitações do Bolsonaro. 

Há pessoas que têm não só a ideologia da direita, mas querem converter o estado laico em um estado confessional. Outros estão se beneficiando ou recebendo toda a cobertura econômica, tirando sarro da lei de financiamento dos partidos, com apoio dos grandes bancos, das grandes empresas que, durante a pandemia, ganharam dinheiro no Peru. Estão aí bancos, farmacêuticas, laboratórios, clínicas privadas etc. Então temos vários desses, mas ainda é cedo para saber o que vai acontecer até o 11 de abril. Acho que agora é preciso ver esse espectro, mas, sim, há vários disputando o espaço da extrema direita. E o problema que temos é que está sendo criada uma polarização entre a extrema direita e a extrema esquerda. E isso é... isso é ruim e bom. É ruim porque o eleitorado entra em um contexto de divisão que pode gerar, mais adiante, quando for eleito o governo, uma ruptura como a que vivemos hoje, nesses últimos cinco anos, com o Congresso e o governo. E é bom, porque também pode ser que nestes dias, o eleitorado veja uma posição mais progressista, que não esteja nos extremos, mas que, sem abandonar posições radicais, possa resolver os problemas. Sobretudo se já teve experiência de governo.

No Brasil, a Lava Jato se revelou uma operação obviamente política. Houve um grande esforço para investigar o ex-presidente Lula, mas não outros ex-mandatários, como foi o caso de Fernando Henrique Cardoso. Muitas vezes, ele foi preservado nas investigações. Então é possível dizer que, no Peru, onde a justiça investiga tantos ex-presidentes, que há esse aspecto político nos processos? Como você enxerga essa situação?

Bom, no caso do Brasil, me desculpem por dar minha opinião, não sou especialista e, por respeito, eu apenas opino, mais nada. Mas eu tenho a impressão que a Lava Jato é uma… está dentro do que chamamos de lawfare ou a judicialização da política. E isso teve vários objetivos no Brasil. Primeiro, o Brasil vira a oitava economia do mundo, com empresas que exportam capitais. É um país que faz o mesmo percurso das grandes potências. Inclusive desloca empresas europeias e norte-americanas do continente latino. Dá uma expressão ideológica-política ao governo. Além disso, chega ao continente africano. Então, da noite para o dia, o Brasil vira realmente um país, uma potência econômica. Não apenas um país grande geograficamente. E acho que isso as grandes corporações globais não perdoaram. Tinham que, de alguma maneira, impedir que o Brasil fosse uma superpotência ou uma potência mundial na América do Sul. Mudaria a geopolítica do mundo. Isso geraria muitas desavenças com as grandes corporações mundiais. 

O outro tema é a ambição de botar a mão na Petrobras, para o processo de privatização da Petrobras, que é a segunda ou terceira maior empresa do mundo em questão de hidrocarbonetos. Tanto é assim que a Petrobras teve que abandonar posições importantes no Peru, no mercado de reservas petrolíferas, e se retraiu ainda mais, embora sejam de conhecimento público as grandes jazidas petrolíferas que há no litoral norte do Brasil. Com isso, pode igualar ou competir com a Venezuela. Então, estamos falando de um país com enormes riquezas petrolíferas, ou recursos naturais. É um país enorme. São mais de 250 milhões de habitantes [na verdade, 213 milhões segundo a mais recente projeção do IBGE]. Um país que, na América do Sul, não fica à sombra de ninguém. 

Além disso, o país tinha um governo que começou a liderar uma política social e a unir, depois de muitos séculos, a América Latina. Processos assim foram vistos na época de Simón Bolívar. Hugo Chávez, por exemplo, também quis unir a América Latina, e obviamente faltava o respaldo brasileiro. Então, acho que a Lava Jato é mais um assunto político, uma judicialização para eliminar uma corrente que poderia ser encabeçada pelo Lula… ou outra pessoa. Mas, naquele momento, era o Lula que liderava isso. E acho que essas ramificações da Lava Jato também ocorreram no Peru. Guardadas as devidas proporções com o PT, no nosso caso também ocorreu, porque temos sido judicializados sem sermos funcionários públicos. Sou o único político que as pessoas vinculam ao PT, sendo que o PT rejeitou as imputações de ter financiado nossa campanha. No caso dos outros ex-presidentes, já é outra coisa. Aí estamos falando de casos de corrupção, por cobrar propina quando eram funcionários públicos. Nosso caso é sui generis. Não nos acusam de corrupção, mas simplesmente nos acusam de supostamente ter recebido financiamento na nossa campanha do presidente Hugo Chávez – algo que o governo venezuelano negou – e do Partido dos Trabalhadores – que também rejeitou essa acusação –, em um caso  no qual a empresa Odebrecht teria feito o serviço de delivery. Mas os outros casos são de empresários ou políticos que não têm a ver conosco. Somos alheios a esses temas.

Não fomos embora do país, assim como Lula. Temos enfrentado essas coisas no Peru. Mas essa lawfare feita aqui pela Lava Jato tem um componente de gênero, que eu não tinha visto em outros casos de lawfare. É um componente que afeta minha esposa. Ela não foi funcionária pública, não exerceu nenhum cargo político no governo e, mesmo assim, tem sido perseguida. Inclusive fizeram com que renunciasse a um cargo de diretora na FAO [Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura], em Genebra. E ela veio para o Peru para enfrentar essas coisas. E tanto ela como eu sofremos uma prisão preventiva de quase 10 meses. E as prisões foram revogadas pelo Tribunal Constitucional [a suprema corte peruana]. Não nos fizeram um favor. O que ocorreu foi um abuso que o próprio tribunal considerou uma medida inconstitucional e arbitrária. E, mesmo assim, o sistema de justiça mantém esse juiz [Richard Concepción Carhuancho], nosso equivalente ao Moro, a cargo do caso. E o procurador [chefe do Equipo Especial, a Lava Jato peruana] também segue no caso. E, como vocês sabem, porque vocês publicaram uns áudios do senhor Belaúnde [Martín Belaúnde Lossio], um aspirante eterno à delação premiada, tramando e confessando em uma reunião com os procuradores, como ele combina com o procurador do nosso caso para nos atacar, nos criminalizar, com o objetivo de ter perdoados os crimes dele em outros casos. 

Então acho que é o mesmo sistema de delação que tem funcionado tanto no Brasil quanto aqui. Isso vira uma organização criminosa, promovida pelo Ministério Público, no qual nossas defesas não podem se defender realmente, porque não sabemos o que eles falam entre eles. Não sabemos o que oferecem a eles. Mas essas declarações dos delatores são vazadas pelo Ministério Público aos meios de comunicação. Os meios publicam essas declarações e se produz um linchamento midiático. Esse linchamento repercute como elemento de prisão para que os juízes cedam às vontades do Ministério Público. E o Ministério Público está mais preocupado em fazer detenções preventivas, em prisões domiciliares e menos em achar a verdade. Eles confundem o sucesso ou confundem casos emblemáticos com casos que acabem em prisão de qualquer jeito. Não são objetivos. São subjetivos e atuam conforme a opinião pública. 

Presidente, aproveitando que o senhor falou um pouco sobre a atuação do Ministério Público no Peru e na relação que mais ou menos temos aqui com o juiz Sergio Moro, você acha que o juiz Richard Concepción Carhuancho e procuradores da Lava Jato peruana podem ter objetivos semelhantes no Peru? E como seria a resposta da sociedade?

Bom, evidentemente o juiz Concepción Carhuancho, que nos impôs a prisão preventiva, e que foi revogada pelo Tribunal Constitucional, ainda não se afastou do caso, e os juízes superiores o mantiveram ali de qualquer forma. Embora a gente tenha entrado com ação contra ele e os juízes de segunda instância, o judiciário afastou do caso os outros magistrados, mas ele não. Ele foi mantido. E esse juiz [Carhuancho] já disse abertamente que é um admirador de Sergio Moro. Além disso, antes de ser juiz, ele foi candidato por um movimento regional para campanhas eleitorais. E, até onde sei, seu irmão estava se candidatando ao Congresso ou tinha essa intenção. Mas o problema que tem ocorrido aqui é a judicialização da política e a politização da justiça. O que eu quero dizer: na época do [ex-presidente] Alan García, o poder judicial estava infiltrado por apristas [da Aliança Popular Revolucionária Americana]. E era a forma como eles neutralizavam ou atacavam seus adversários políticos, levando-os ao poder judicial. Hoje em dia, o poder judicial também converteu essa relação com o Apra ou com o fujimorismo numa via dupla. 

Vemos casos, como por exemplo, do juiz César Hinostroza [ex-juiz da Suprema Corte], que estava refugiado na Espanha e o Supremo está pedindo sua extradição. Este senhor também está pedindo parcelas de poder político à Keiko Fujimori. Agora não é apenas o poder judicial sendo, em alguns casos, penetrado por operadores políticos e alguns maus funcionários do sistema de justiça que cedem, mas agora também pedem sua parcela de poder. Evidentemente, é um isso é um novo fenômeno. Estamos vendo isso no caso de Concepción Carhuancho, cujo irmão está se candidatando ou está na fila para se candidatar por um partido político. Tem o caso do procurador Rafael Vela [chefe do Equipo Especial], cujo irmão está se candidatando ao Congresso e também se candidatou na eleição passada. Como se fez famoso, agora está tentando manter esse poder, mas agora no Congresso da República. Então sim, efetivamente, acredito que seja o mesmo fenômeno e no final tenho entendido que o Moro acabou indo trabalhar numa administradora dos fundos da Odebrecht nos Estados Unidos. Vocês vão decidir o que fazer com o Moro, mas aqui no Peru seria bem previsível que esses operadores do sistema de justiça depois tentem obter poder político.

No Brasil, se diz que a imprensa tem sua culpa por não ter questionado as denúncias feitas nas investigações. No Peru também houve algo assim, em relação aos aspirantes à delação premiada: a imprensa tomou como verdade e não houve questionamento. É isto?

Aqui no Peru há o grupo de El Comercio [principal jornal do país] que tem a concentração de aproximadamente 70 a 75% dos meios de imprensa escrita e televisiva. Ademais, eles também têm um “braço armado”, que é a principal construtora, Graña y Montero [GyM]. Os acionistas principais do grupo televisivo, do grupo de comunicação de El Comercio, à parte tinha uma construtora que cresceu de mãos dadas com a Odebrecht. Ambas têm sido uma espécie de “amantes” no Peru, porque a maioria dos projetos que a Odebrecht ganhou no Peru, ganhou das mãos de GyM. Hoje em dia, os acionistas da GyM, os primos Graña, acionistas de El Comercio, são aspirantes à delação premiada. Ou seja, admitiram que cometeram crimes e estão tratando de abrandar suas penas. Além disso, esses grupos tiveram uma etapa vergonhosa nos anos 1990, quando venderam sua linha editorial à ditadura de Alberto Fujimori e do assessor Vladimiro Montesinos. E muitos desses meios receberam montanhas de dinheiro no caso Vladivideos [Nome do escândalo de corrupção protagonizado e gravado em fitas caseiras por Vladimiro Montesinos, assessor do ditador Alberto Fujmori.]

Agora, na etapa da Lava Jato, esses grupos têm o que aqui chamamos de Rabo de Paja [expressão semelhante a “teto de vidro”], um pecado. E qual é o pecado que eles têm para não fazer uma cobertura independente em relação ao Grupo Especial: é que, ao final de toda a investigação sobre financiamento de partidos políticos... Que no Peru não era crime, só vira crime em 2019, mas antes não era crime. Nós rechaçamos as imputações, mas sequer era crime. Só a partir de 2019 estão regulando o financiamento dos partidos. Bom, 85% ou 90% da verba das campanhas foram destinadas a esses meios de comunicação. Ou seja, se queremos seguir a rota do dinheiro, supostamente criminosa, de lavagem de dinheiro, o dinheiro ficou com o grupo El Comercio. Grande parte do dinheiro ficou com os grupos de comunicação. Eles receberam a grana. 

Na campanha de 2006, muitos dos repasses se faziam em espécie, porque não havia regulação, e o dinheiro era dado aos meios de comunicação. E, em 2011, foi por transação bancária. Mas o dinheiro está aí. Então, há um acordo silencioso. Esses grupos de comunicação e o grupo El Comercio, que têm como principais acionistas pessoas que são aspirantes a delatores. A qualquer momento a procuradoria poderia cair em cima de Graña y Montero, porque segue operando no Peru. Eles são servis à força-tarefa. Então, o diário El Comercio serve de porta-voz da Lava Jato do Peru. Eles colocam o nome de “unidade de investigação”, mas aí não tem nada de investigação. Uma coisa é o Intercept, que faz investigação. Eles não. Simplesmente o que eles recebem [de delações] eles colocam no ar, na hora que disserem para eles. É uma atitude totalmente servil. O grupo Graña y Montero é aspirante à delação premiada, porque estão metidos no que aqui é conhecido como o “Clube da Construção”. Estão metidos em um cartel de construtoras que se aliam a maus funcionários públicos para evitar a concorrência por obras, e entre eles sorteiam quem fica com a obra. E pagam comissão a esses maus funcionários. Então aí está o grupo Graña y Montero no chamado Clube da Construção, mas além disso Graña y Montero também está de mãos dadas com Odebrecht em projetos que ocorreram no governo de Alan García, como no caso da Linha 1 do Metrô de Lima.

Ainda sobre Lava Jato: quais são as alternativas para efetivamente combater a corrupção sem gerar instabilidade política. E o que o senhor faria se fosse eleito presidente? O que pode fazer para combater?

O problema que existe no sistema da Lava Jato é que existem duas procuradorias especiais: anticorrupção e lavagem de dinheiro. A força tarefa anticorrupção já conseguiu sua primeira sentença relacionada à Lava Jato, que é de um governador regional que se envolveu com empresas brasileiras. Para isso, não foi preciso fazer nenhum acordo de colaboração com a Odebrecht. E do outro lado está o Equipo Especial encarregado de lavagem de dinheiro. Este, por sua vez, cometeu um grande erro em 2016 ao deixar de investigar os casos e simplesmente confiar nas informações que a Odebrecht concedia. Então, fizeram um acordo totalmente obscuro, que ninguém conhece. Hoje em dia, esta equipe especial depende totalmente do que dizem Jorge Barata e Marcelo Odebrecht para levar seus casos a julgamento. O erro da equipe da Lava Jato é que se deixaram seduzir pela Odebrecht. E priorizaram as investigações e vazar informações sobre financiamento de campanha, que não eram crime no Peru, deixando de lado as propinas que pagavam as empresas a funcionários públicos, que é efetivamente corrupção. Eles se dedicaram mais à parte midiática.  Quando o ex-presidente Martín Vizcarra vai ao Brasil para a posse de Bolsonaro, o Equipo Especial o fez voltar para que ele os defendesse. Então, o erro da Lava Jato é ter se dedicado a perseguir os políticos, tratando de pôr ou tirar presidentes, em vez de investigar o que correspondia à lavagem de dinheiro. 

Quanto à corrupção, precisamos entender que ela se sustenta em quatro patas: primeiro, autoridades eleitas, desde prefeitos até o presidente. Em segundo lugar, os funcionários públicos, que trabalham na burocracia estatal. Em terceiro, as empresas. E a quarta é a justiça. Então, se você eleger um representante que não tem experiência na governança público, no Estado, aí há um risco de corrupção. E, se as pessoas estão cansadas, pode-se eleger até um palhaço, sem escolaridade, como mais votado. Outro problema é o funcionário público, que muitas vezes ganham mais dinheiro com sua assinatura para aprovar um projeto do que ganham mensalmente. Chamamos de clientelismo, patrimonialismo. Também temos os empresários, que chamamos de “empressauros”, que confundem o modelo de economia aberta com o mercantilismo econômico. Aqui, esse mercantilismo econômico, ou neoliberalismo, já não há ética. Tratam de alterar as regras do mercado através de funcionários públicos. E a última “pata” é a justiça: não basta que a lei seja igual para todos, todos também devem ser iguais perante a lei. Porque, senão, quem moraliza o moralizador? Quem julgaria Sergio Moro? Quem vai julgar os juízes que se comportam mal e abusam do poder? Além disso, a justiça deve ser impenetrável, não deve permitir que seja politizada, deve ser autônoma e não autárquica.

Presidente, agora sobre ideologia. Sabemos que existem muitas esquerdas na América Latina, desde a esquerda liberal até os sandinistas na Nicarágua. Muitos dizem que essa fragmentação provocou a queda recente da esquerda. O que você pensa? E com qual esquerda se identifica?

Eu considero que houve uma evolução dos movimentos de esquerda. Mas, no Peru isso não aconteceu. No Peru, temos uma esquerda mais infantil. Aqui dizemos: dois nomes de esquerda, dois partidos políticos. E isso é uma fragmentação histórica que acontece na esquerda no Peru. Inclusive, na época do terrorismo, a esquerda cometeu o erro garrafal de não defender o estado de direito e tentar ver se conseguiam algo do Sendero Luminoso [grupo guerrilheiro]. São erros, pecados graves, que a esquerda peruana ainda paga. De tal maneira que, se na maioria dos países latino-americanos a esquerda chegou ao poder, no Peru, se muito, chegou duas vezes à prefeitura de Lima, e na segunda vez a prefeita saiu envolvida em esquemas de corrupção. 

A única vez que a esquerda chegou ao governo foi com o nacionalismo. O nacionalismo é uma versão moderna do que é a luta contra injustiça e a luta contra a desigualdade. Para nós, no âmbito nacional, temos diferenças com a esquerda, mas no âmbito internacional nós nos identificamos com movimentos de esquerda. Eu me identifico com toda a política social do PT, me identifico com a política internacional do Uruguai, com Pepe Mujica. Então, nós nos identificamos com o que é a esquerda latino-americana, apoiamos a Unasul, apoiamos estar dentro do bloco com [Hugo] Chávez e Lula, dentro de uma esquerda progressista, que conquistou batalhas importantes, como a inclusão de Cuba na Cúpula das Américas, por um freio nas ambições dos EUA, o que lamentavelmente já não existe. O nacionalismo é um movimento ideologicamente mais antigo que a esquerda, ele vem da época dos Incas. Como partido, somos mais jovens que a esquerda, mas a esquerda no Peru é influenciadas por visões do primeiro mundo, da época de 1917. 

Nenhum dos líderes esquerdistas conheceram bem a realidade do Peru. O líder máximo da esquerda peruana foi José Carlos Mariátegui nos anos 1930, mas o que tinha era um pensamento nacionalista, tratava do problema indígena etc. Era um pensamento nacionalista. O que eu digo é que o mundo é multipolar, já não há um bloco socialista como referência. Agora acho que a discussão não é tanto mais sobre esquerda contra direita, mas dos que estão em cima contra os de baixo. Se o Brasil passasse a ser uma potência mundial, ia adotar políticas imperialistas, entraria em oposição ao nacionalismo peruano, que vai contra qualquer imperialismo. Em uma das vezes que falei com Fidel Castro, ele me falou que a Revolução Cubana, na verdade, foi uma revolução nacionalista. Só depois de ter chegado no poder que assumiu uma cobertura do Partido Comunista. Mas inicialmente foi uma luta de libertação nacional contra Fulgencio Batista e o poder dos Estados Unidos. Creio que aqui, a maioria das lutas sociais na América Latina são lutas contra o imperialismo. O que acontece é que o imperialismo se identifica com os EUA e por isso se confundem movimentos nacionalistas com movimentos de esquerda. Mas, enfim, somos primos irmãos.  

Seu governo foi muito criticado por alguns setores de esquerda, que o chamavam de neoliberal. E a atual candidata à presidência, Verónika Mendoza, que era de seu partido, disse que o senhor havia “traído” o projeto nacionalista. Como você responde a essas críticas e que tipo de política econômica propõe para um eventual próximo governo?

O nacionalismo sempre veio de quem está abaixo. Nós recebemos uma série de críticas da esquerda que diz que nós os traímos, e também da direita que diz que somos inimigos do investimento privado. Quando eu conversava com Pepe Mujica [ex-presidente do Uruguai], ele me dizia “Ollanta, esta é a fórmula perfeita. No Uruguai os companheiros de esquerda dizem que passei para a direita. E os de direita dizem que sou inimigo dos investidores. Esse é o caminho correto, isso deve te indicar que está indo pelo caminho correto”. Nós trabalhamos, por exemplo, na “Pensión 65”, uma pensão não contributiva para os idosos em situação de vulnerabilidade. Criamos um plano de mais de 100 mil bolsas de estudo. Criamos o imposto à riqueza das empresas de mineração, o imposto ao lucro excessivo da mineração. Nós criamos mais de 30 programas sociais, duplicamos o Juntos, um programa como o Bolsa Família. Criamos o SAMU. Criamos uma série de programas focados nos mais pobres, mais além de esquerda e direita, é para quem está embaixo.

Então eu lamento que a esquerda não tenha entendido isso. E normalmente esses grupos de esquerda foram embora chutando a porta, porque, como nunca foram governo, ficaram acostumados a ser oposição. E ser oposição é mais fácil que ser governo. É fácil reclamar, difícil é construir. Eu lhe dou um dado: nós fizemos um plano de governo e o capítulo econômico desse plano quase nos faz perder as eleições. Sobre este plano de governo, que também incluiu gente de esquerda, fizemos um resumo executivo que foi chamado de hoja de ruta, um roteiro. Muito similar ao que Lula fez no Brasil para ganhar as eleições. Lula também juramentou sobre um documento [a Carta ao Povo Brasileiro]. Igualzinho a nós: fizemos um roteiro e juramentamos diante do país e todos os grupos de esquerda deram aval a isso. E nós cumprimos escrupulosamente esse roteiro. Então o que eles poderiam chamar de traição? Isso é o que não entendo. Isso é, na verdade, um oportunismo político. O oportunismo político é o problema que tem a velha esquerda por aqui.

Por exemplo, essa senhora Mendoza e todos esses grupos de esquerda que nos acompanharam no governo, só o que fizeram foi nos isolar internacionalmente. Do Foro de São Paulo, do Grupo de Puebla, nos isolaram com esse papo de traição. Mas nós não traímos o povo. Em todo caso, eles perderam seu salário, porque deixaram de trabalhar no governo. Traíram justamente a linha do governo. Nos subestimaram e acharam que poderiam governar por nós. Ou seja, o motor da campanha, como é de conhecimento público, tenho sido eu. Eles não ganharam nada. Um dos seus grandes expoentes, Javier Diez Canseco, tinha só 0,5% dos votos como candidato à Presidência. E eu tive a generosidade de levá-lo ao Congresso, levar todos eles para lá. E a primeira coisa que fizeram, no primeiro problema que surgiu, foi pular do barco e nos deixar sozinhos. E foram embora acusando traição, quando não traímos ninguém. Tínhamos criado o imposto sobre o lucro da mineração, a lei da consulta prévia [lei que exige que os povos indígenas sejam consultados sobre medidas do governo que afetem diretamente seus direitos], criamos programas sociais que já citei e conseguimos começar uma grande transformação que talvez eles não tenham entendido.

E em que ela consiste: para o modelo neoliberal, a política de redução da pobreza se faz sobre a base do crescimento econômico. Ou seja, tirar gente do bolsão da pobreza. A estratégia é crescer para incluir. Esa é a teoria que no Peru se chama “teoría del chorreo” [trickle-down economics ou economia de gotejamento: a ideia de que distribuir dinheiro e benefícios pros mais ricos empreenderem/investirem vai eventualmente respingar nos mais pobres]. Nós mudamos essa estrutura e falamos de incluir para crescer. Ou seja, primeiro redistribuimos para que haja mais gente capaz de aportar à economia nacional. Essa foi a grande mudança que esses velhos dirigentes de esquerda não entenderam. E isso teve um êxito muito importante no Peru. A segunda grande transformação que fizemos é que entregamos o governo e conseguimos essa estratégia para reduzir a pobreza sem danificar a estrutura do equilíbrio macroeconômico do país, sem danificar a economia do país. Porque há muitos modelos que tiveram a ideia da redistribuição antes do crescimento, terminaram destruindo as bases da economia e criaram crises humanitárias, crises econômicas inclusive no Equador até perderam sua moeda [o Equador dolarizou sua economia em 2000]. No Peru, não. No Peru, durante nosso governo, mesmo com a crise dos metais de 2014, fomos um dos poucos países que seguiu reduzindo a pobreza na América Latina e mantendo um ritmo de crescimento de 4,2% com níveis de endividamento em torno de 20%. Ou seja, nossa economia se converteu em uma das mais sólidas da América Latina, provavelmente. Não uma das maiores, a economia brasileira é maior, mas nossa economia, que é mais pequena, era mais sólida pelos termos macroeconômicos. E isso quem fez fomos nós. Eu acredito que esse é um segundo ponto muito importante dessa grande transformação nacionalista, que lamentavelmente muitos companheiros de esquerda não entenderam.

Presidente, agora sobre a história recente. Quem é Martín Vizcarra na visão do senhor? E por que as acusações de corrupção causaram mais dano à sua imagem do que à dele?

Bom, no nosso caso, lembre-se que em 2016, 2017, quase até 2018, nós estivemos sozinhos. Éramos os únicos atacados por toda a classe política, pelo Grupo Comercio, Grupo Graña, pelas grandes empresas. Os poderes econômicos estavam contra nós e ninguém mais, porque nós enfrentamos todos esses grupos. Eles estavam acostumados a governar com Alan García. O Grupo Brasil [grupo que representa empresas brasileiras no Peru], por exemplo, estava acostumado a reuniões mensais, um almoço mensal no Palácio de Governo com García ou na casa de algum dos empresários brasileiros. A classe política estava acostumada a ir às feijoadas na Embaixada do Brasil a colocar a camiseta da Seleção Brasileira, e você não me encontrará nesse tipo de situação. O empresário estava acostumado a coludir com os políticos e, quando fui presidente, jamais permiti que um empresário colocasse a pauta do que vou fazer. Então, durante quase 3 anos, estivemos sozinhos enfrentando mais de 3.500 capas de jornais do grupo Comercio pedindo nosso linchamento. Enfrentamos moções unânimes do Congresso contra minha esposa, a senhora Nadine Heredia, para que o Estado peruano apresente uma queixa junto à ONU e minha esposa volte de seu cargo na FAO. O próprio presidente Pedro Pablo Kuczynski [sucessor de Humala, presidente entre 2016 e 2018, quando foi levado a renunciar] se meteu nisso. Ou seja, o poder executivo, o legislativo e o judiciário se uniram para tratar de destruir minha esposa, que não era funcionária pública, e também a mim e meu legado.

O caso de Vizcarra é outra coisa. Vizcarra, eu diria, é uma pessoa que traiu o presidente. Se você lembrar, na primeira tentativa de destituir Kuczynski, ele vem a público com seus dois vices e diz “se me tirarem, os dois renunciam”. E se ele fizesse isso, o Congresso teria que convocar novas eleições. E o Congresso não queria isso, o Congresso queria governar o Executivo. Keiko Fujimori queria governar o Executivo. Então tiveram que retirar o voto para remover o presidente e primeiro conseguir romper essa unidade dos vices e conseguiram com Vizcarra. Só assim obrigam Kuczynski a renunciar e entra Vizcarra. No aspecto pessoal, acredito que Vizcarra foi um político tradicional, acostumado a sobreviver e que, além do que fala, não cumpre o que diz. Quando eu era presidente, ele era governador e eu dei três obras para ele e não completou nenhuma, apesar de eu ter dado o financiamento. Então é um sujeito sem importância, uma cara nova, que não teve muito tempo para ser questionado. Mas que hoje em dia, evidentemente, está sendo fortemente questionado por atos de corrupção. Não é um tema de lawfare, e sim atos de corrupção.

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